O diagnóstico do TEA é essencialmente clínico e comportamental. Ainda não existem marcadores bioquímicos ou moleculares que auxiliem no diagnóstico da condição.
Por se tratar de um distúrbio complexo, seu diagnóstico pode implicar numa jornada trabalhosa, realizado por profissionais especializados, que envolve anamnese, avaliação clínica, estudo do histórico familiar, observação do comportamento da criança, avaliação por médico especializado, psicólogo, entrevistas com os pais, terapeutas e a aplicação de instrumentos específicos.
O TEA é causado pela combinação de múltiplos fatores genéticos e ambientais. Os fatores de risco genéticos para TEA se sobrepõem a outros diversos transtornos do desenvolvimento e psiquiátricos.
Estudos científicos com pacientes gêmeos estimam que a herdabilidade do TEA gira em torno de 50% a 90% e que o diagnóstico em irmãos de crianças diagnosticadas seja de 6,1% a 18,7%. É relevante lembrar que a recorrência em irmãos do sexo masculino é mais alta.
Apesar de claramente importantes, os fatores genéticos não atuam sozinhos, sendo sua ação influenciada pelos fatores ambientais e epigenéticos.
Levando todo esse contexto em consideração, o componente genético no TEA pode variar, desde ser a única causa associada à condição (ocorre mais raramente, apenas 1% dos casos), como estar associado em menor grau a uma das causas, conferindo apenas um aumento da suscetibilidade.
É exatamente nesse ponto que o médico geneticista, em parceria com a equipe multidisciplinar, atua na investigação do TEA. O médico geneticista avaliará o paciente e procurará sinais clínicos que indiquem situações em que possíveis causas genéticas possam estar presentes e solicitar os exames genéticos, quando forem aplicáveis.
Nas situações em que é possível estabelecer uma causa genética, pode-se calcular a chance de recorrência na família, diferenciar se a alteração é exclusiva do paciente, ou vem herdada dos pais, e com isso programar próximas gestações e, inclusive, a programação de filhos do próprio paciente quando chegar o momento. Em algumas situações, quando há outros indivíduos descritos com a mesma alteração, é possível estabelecer um paralelo de como é o histórico do transtorno para essas pessoas e prever alguns eventos clínicos para o paciente diretamente.
Somente o médico, com base no histórico pessoal e familiar do paciente, pode avaliar os benefícios e limitações da realização de um teste genético para o Transtorno do Espectro Autista.
O que os exames genéticos podem indicar sobre o futuro?
Considerando todas as ferramentas de investigação genética disponíveis atualmente, é possível, hoje em dia, identificar alterações genéticas que expliquem a etiologia do TEA em aproximadamente 25% dos indivíduos. Esse número tende a aumentar conforme os testes genéticos forem mais utilizados, uma vez que os bancos de dados para interpretação dos resultados vão sendo progressivamente alimentados.
Nos dias atuais muitas pesquisas pelo mundo estão dedicadas a entender as bases genéticas dos TEA. Consórcios de bancos de dados genéticos para investigação do autismo funcionam como plataformas colaborativas que reúnem informações genômicas de indivíduos com autismo, visando identificar padrões genéticos associados ao transtorno. Esses consórcios facilitam o compartilhamento de dados entre pesquisadores, promovendo estudos mais amplos e robustos sobre a genética do autismo e acelerando o desenvolvimento de testes diagnósticos e terapias mais eficazes.
Só para citar alguns exemplos de consórcios:
1. Autism Sequencing Consortium (ASC)
2. EU-AIMS (European Autism Interventions – A Multicentre Study for Developing New Medications)
3. SPARK (Simons Foundation Powering Autism Research for Knowledge)
4. IBIS Network (Infant Brain Imaging Study)
Embora os exames genéticos apresentem limitações, existem muitos benefícios importantes a serem levados em consideração, especialmente nos casos de pacientes com o diagnóstico de TEA e mais outras situações, como:
- Associação com outras condições neurológicas, especialmente epilepsia de difícil controle
- Histórico familiar de TEA e/ou histórico familiar de síndrome genética
- Regressão no desenvolvimento
- Sinais clínicos de dismorfismos, que são alterações físicas atípicas. Destacamos a medida do perímetro cefálico. Entre 20% e 30% das crianças com TEA apresentam circunferência da cabeça maior que o percentil 97 (macrocefalia). A microcefalia também pode ser um sinal de alerta.
Novamente vale citar que somente o médico, com base no histórico pessoal e familiar do paciente, pode avaliar os benefícios e limitações da realização de um teste genético para o Transtorno do Espectro Autista.
Por fim, é importante que as famílias entendam que um resultado negativo em um exame genético não exclui a possibilidade de autismo. O transtorno é complexo e multifatorial, e muitos fatores ambientais e genéticos ainda não são totalmente compreendidos. E devem sempre procurar o pediatra de seu filho, para que oriente e faça os encaminhamentos necessários.
Relatora:
Patrícia Salmona
Médica Pediatra e Geneticista
Presidente do Departamento Científico de Genética da Sociedade de Pediatria de São Paulo


