O que significa “deficiência” para você?

O que significa “deficiência” para você?

Hoje, 21 de setembro, é o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência. A data é comemorativa, mas o verbo é de trabalho: lutar. Avançamos nas últimas décadas – leis, políticas, narrativas –, porém a trilha da inclusão continua diária e árdua. Para incluir, é necessário registrar e compreender: de quantas pessoas estamos falando, onde estão e que barreiras encontram. Ao mesmo tempo, a deficiência – como toda condição humana – é diversa. Entender as singularidades de cada criança e de sua família requer escuta, tempo e respostas ajustadas. Não há solução única: há adaptações e apoios que respeitam diferentes modos de funcionar.

Crianças e famílias seguem enfrentando barreiras de acesso à saúde, à educação e à proteção. Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 240 milhões de crianças no mundo – uma em cada dez – vivem com alguma deficiência e, em média, apresentam os piores indicadores nesses três campos. Em 2021, a UNICEF reforçou o alerta com um retrato que não podemos ignorar: crianças com deficiência têm 24% menos probabilidade de receber estimulação precoce e cuidados responsivos, 42% menos chances de alcançar habilidades fundamentais de leitura e matemática e 49% mais probabilidade de nunca frequentar a escola. Em saúde, há 25% mais chances de desnutrição, 34% mais de prejuízos no crescimento e ganho de peso e 53% mais de sintomas de infecção respiratória aguda. No bem-estar e na proteção, há 51% mais probabilidade de se sentirem infelizes no dia a dia, 41% mais de sofrer discriminação e 32% mais de punição corporal severa.

Esses números não definem pessoas: expõem barreiras. Crianças que precisam de mais apoio para comunicação e autocuidado estão entre as que mais ficam fora da escola. Quando há múltiplas deficiências, a evasão cresce ainda mais. A resposta pública e institucional, portanto, precisa sair da lógica do “padrão” e assumir o desenho universal, com acessibilidade arquitetônica, comunicacional, atitudinal e pedagógica, além de ajustes razoáveis que tornem ambientes e serviços utilizáveis por todas as pessoas.

Educação inclusiva não é utopia – é base de cidadania. Atenção integral à saúde não é favor – é direito. E direitos reais pedem orçamento, formação continuada, protocolos intersetoriais e monitoramento. Também pedem humildade institucional para aprender com as famílias e com as próprias crianças o que funciona, quando e como. Na prática, isso significa registrar adequadamente, mapear necessidades com participação das famílias, garantir acessibilidade e recursos de apoio, ajustar fluxos de cuidado e formar equipes para acolher sem infantilização nem estigma. E, sobretudo, sustentar políticas com continuidade e avaliação de impacto, em corresponsabilidade entre saúde, educação e assistência – porque a vida não cabe em uma secretaria só.

Quando perguntamos “o que significa deficiência para você?”, não buscamos uma definição de dicionário, mas um compromisso: reconhecer a pluralidade humana e, diante dela, escolher práticas que não deixem ninguém para trás. Hoje – e todos os dias – que a nossa resposta seja concreta: olhar, contar e cuidar. O resto é discurso. E discurso, sem acesso real, segue produzindo aquilo contra o que diz lutar: invisibilidade.

 

Saiba mais:

  • Organização Mundial da Saúde (OMS). Global report on children with disabilities. Geneva: World Health Organization, 2021.
  • Seen, Counted, Included: Using data to shed light on the well-being of children with disabilities. New York: United Nations Children’s Fund, 2021.

 

Relatora:
Anna Dominguez Bohn
Carolina Videira
Núcleo de Estudos sobre a Criança e o Adolescente com Deficiência da SPSP