#nóstodossomosyanomamis

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A desgraça humanitária que está acometendo a tribo dos Yanomamis incomoda e entristece aqueles que ainda não têm coração endurecido, seja pela crueza imposta pela vida ou, simplesmente, pelo cinismo. Para nós pediatras, com um pouco mais de idade, dói profundamente ver crianças com quadro que nos remete ao passado de nossa formação acadêmica e de especialização, quando eram frequentes os casos de desnutrição grave, do tipo Marasmo ou Kwashiorkor. Não quero repetir um discurso já “surrado” de que houve negligência, conivência, intencionalidade, ou qualquer outro adjetivo que queiram utilizar para descrever atitudes no mínimo arrogantes – este assunto é ético.

Os Yanomamis estão no mesmo patamar dos desprotegidos pela pobreza, dos desvalidos da sorte, dos que não nasceram em berço de ouro, dos que não são brancos, dos que perambulam pelas ruas sem emprego e sem teto. Há seres humanos de primeira classe e os que são de outra espécie.

Aos primeiros “eu trato como um igual”; aos outros, “eu trato como objeto de minha manipulação”. “Melhor seria se não existissem”…

A linha ética que separa um Yanomami de um cidadão da cidade marginalizado é inexistente. Ambos estão fora do mercado de trabalho e parecem não contribuir para o progresso. A sensibilidade para este assunto não pode ser rebaixada a um patamar menos importante que o racismo, ou a xenofobia, ou qualquer outro tipo de preconceito – em todos eles o que está em jogo é o conceito de pessoa humana e da dignidade humana.

Ah, o progresso! O progresso está em respeitar as terras delimitadas de um povo que vive da caça, pesca ou plantação local; está em impedir que haja contaminação de rios com os produtos do garimpo, principalmente do ilegal; está em proteger crianças e mulheres de sofrerem abuso. E está em governar para todos e não só para alguns – afinal somos uma sociedade com “diferentes” e não “só de iguais”.

E uma sociedade que não sofre com o drama humanitário dos Yanomamis está doente. Aqueles que são indiferentes estão num descaminho perigoso – quando não se respeita a dignidade humana, nada impedirá que outros holocaustos também venham a acontecer.

A história quando se repete é porque os homens nada aprenderam com ela. O pior dos mundos é aquele em que um homem é incapaz de se ver no outro. Quando esta afirmação for avaliada como ingênua ou romântica, é porque estamos começando a endurecer o coração.

Que os poetas nos socorram e os governantes nos protejam (a todos!).

 

Relator:
Fernando MF Oliveira
Coordenador do Blog Pediatra Orienta da SPSP