Novembro Roxo é o mês dedicado à conscientização sobre a prematuridade e suas complicações, entre elas a Retinopatia da Prematuridade (ROP) – uma das principais causas de cegueira evitável na infância em todo o mundo.
A ROP é uma vasculopatia característica do recém-nascido prematuro, resultante da interrupção abrupta do desenvolvimento dos vasos normais da retina, que deveria ocorrer intraútero. A imaturidade, somada a condições clínicas associadas à prematuridade, cria um cenário em que a retina não vascularizada passa a liberar fatores de crescimento de novos vasos sanguíneos descontroladamente, desencadeando o surgimento de novos vasos e proliferação fibrovascular e, nos estágios mais graves, descolamento de retina e cegueira permanente.
O pediatra é quem define, orienta e cobra o rastreamento sistemático, garantindo que todo bebê prematuro seja avaliado pelo oftalmologista no momento adequado.
As recomendações atuais preconizam que sejam submetidos à triagem todos os bebês prematuros que nascem com menos de ≤ 32 semanas de gestação e ≤ 1.500 g, além de prematuros maiores, em algumas situações (oxigenoterapia prolongada, sepse, transfusões repetidas, ventilação mecânica, hemorragia intracraniana, etc.).
É essencial que o primeiro exame aconteça de acordo com a idade gestacional corrigida; em geral, entre 4 e 6 semanas de vida. O atraso no início da triagem ainda é um dos principais fatores associados à perda de visão evitável.
A importância do acompanhamento até a vascularização completa
O acompanhamento dos bebês não termina após a alta hospitalar. Muitos bebês ainda não têm a retina completamente vascularizada ao deixar a UTI, e a interrupção precoce do acompanhamento pode resultar em progressão silenciosa da doença. A continuidade das consultas oftalmológicas deve ocorrer durante todo o primeiro ano de vida.
O novo cenário do tratamento terapêutico:
Durante décadas, o tratamento padrão para ROP grave foi a fotocoagulação a laser, que permanece extremamente eficaz e ainda é amplamente utilizada. Porém, o laser destrói a retina avascular periférica, podendo gerar sequelas, como redução do campo visual, maior risco de miopia e alterações estruturais futuras.
Nos últimos anos uma revolução silenciosa transformou a abordagem da ROP: o uso dentro do corpo vítreo (substância gelatinosa que preenche o espaço entre a retina e o cristalino dentro do olho) de substâncias e medicamentos que agem neutralizando a produção e surgimento de novos vasos e permitindo que o desenvolvimento vascular fisiológico prossiga de forma mais natural.
Estes tratamentos modernos possibilitam uma vascularização da retina mais fisiológica, com potencial para melhor desenvolvimento visual a longo prazo. No entanto, exige seguimento prolongado, pois pode ocorrer meses após a aparente regressão inicial.
Desafios e considerações importantes
- O acompanhamento oftalmológico pode se estender por até 12 a 24 meses, dependendo da evolução;
- Pode haver recidiva silenciosa, que só é detectada com exames regulares;
- A decisão terapêutica deve sempre envolver diálogo entre oftalmologista, neonatologista e família, considerando riscos, benefícios e particularidades clínicas do bebê.
Uma atuação integrada que salva vidas e a visão
No contexto do Novembro Roxo, é imprescindível reforçar que a ROP é uma doença quase totalmente prevenível, desde que o rastreamento seja rigoroso e o tratamento seja realizado em tempo hábil.
A prematuridade representa um desafio multidisciplinar, e a prevenção da cegueira por ROP é um dos maiores exemplos de como a integração entre pediatria, neonatologia e oftalmologia pode mudar de forma definitiva o futuro de uma criança.
Novembro Roxo nos lembra: cada dia conta. Cada exame conta. Cada olhar conta.
Relator:
Marcelo Alexandre A. Cavalcante
Presidente do Departamento Científico de Oftalmologia da SPSP


