O ensino online e a pandemia

O ensino online e a pandemia

Sociedade de Pediatria de São Paulo
Texto divulgado em 01/07/2021


A educação foi um dos setores mais afetados durante a pandemia do coronavírus. Repentinamente as escolas tiveram que se adaptar e passaram a ter a difícil missão de conquistar a atenção dos estudantes, agora de forma virtual. Para todas as idades, esse desafio foi imenso: seja pela compreensão da lógica das interações virtuais, seja pela falta dos contatos mais descontraídos e menos expostos, seja pela capacidade de concentração.

A falta do lugar da escola pode significar o não pertencimento a essa. O deslocamento, o uniforme, os sinais entre um período e outro são elementos da escola responsáveis por uma organização que não é ao acaso, nem por conveniência. A separação da criança da família e o descobrimento de um espaço de relações próprio é processo essencial a construção do indivíduo.

Crianças e adolescentes necessitam de auxílio para construírem sua própria organização e a escola também tem essa função. As relações, diálogos e a convivência na escola são importantes para o desenvolvimento humano e na escola há o professor, que também vai ser o mediador dessas relações. Estas relações professor-aluno e aluno-escola foram quebradas abruptamente, e as adaptações foram testadas intensamente com “o barco andando”, sem que nem a escola, os alunos ou pais pudessem ter formação e preparação para tal.

A pandemia está fazendo com que crianças e adolescentes tenham que lidar com grandes quebras de expectativa. É uma convivência diária com frustrações relacionadas ao convívio limitado com colegas, amigos e familiares, além da privação de diversas atividades extracurriculares e possibilidades de gasto energético e de socialização, de movimento, de ação, de espontaneidade… tão caros a essa faixa etária como um todo.

Para as crianças e adolescentes a adaptação ao ensino online pode ter sido complicada, mas ela foi ainda mais difícil e os prejuízos acadêmicos foram ainda maiores para aqueles que já apresentavam algum tipo de dificuldade escolar ou algum transtorno de aprendizagem, de linguagem, de atenção ou dificuldades de socialização e cognitivas. Isso levou ao aumento do desnivelamento desses estudantes em relação a seus pares – sem aprofundarmos as possibilidades discrepantes de ensino dentre diferentes escolas, público ou privada.

Além disso, a ausência da escola tem levado muitos jovens ao isolamento social, à desmotivação, à tristeza e à depressão. A criança e o adolescente precisam do seu par (amigo, colega, grupo) para a construção do seu próprio eu, por isso o grupo é tão importante para eles. Essa desmotivação também pode afetar a concentração nas aulas online. Os pais devem ficar atentos aos sentimentos dos filhos, conversar e acolher. Cobrar desempenho, mesmo de alunos que costumavam ser excelentes, pode ser mais um fator de prejuízo emocional. Ouvir e de fato compreender quais são as dificuldades que os filhos possam estar passando nessa modalidade de ensino; tentar entender as dificuldades que as escolas e os professores estão tendo em ensinar; conhecer seus próprios filhos e o que lhes falta nesse momento em termos sociais e atividades motoras. Não culpabilizar a criança e nem a escola…tentar se adaptar o quanto for possível, dar suporte e ajustar as expectativas de todos – sem que os pais tentem assumir o papel de professor, mas tentando dar apoio como pais, dentro de suas disponibilidades.

Organizar o tempo para as atividades escolares – como fazer lições e provas junto com eles – pode ser útil, assim como ajudar a organizar o local do estudo em casa, evitando distrações como animais, celulares, tablets e muita circulação de pessoas. Fazer pausas de telas, permitir gasto energético, praticar exercícios e atividades físicas e promover interações em tempo real, presenciais em pequenas bolhas, quando possível; ou mesmo virtuais, mas com trocas em tempo real e, de preferência, com imagens e olhares.

Haverá tempo para recuperar os conteúdos perdidos, por pior que seja essa perda. Mais importante, porém, é passar segurança para que as crianças e adolescentes desenvolvam sua autoconfiança, preservem a autoestima, construam e mantenham vínculos afetivos e se organizem para poderem atravessar esta fase tão difícil da melhor maneira possível.

Assim como vidas não se recuperam, a construção da personalidade e de uma vida saudável do ponto de vista físico e mental depende muito do ambiente em que estamos inseridos nessa fase de constituição e de como aprendemos a reagir a ele.

Relatoras:
Adriana Monteiro de Barros Pires
Larissa Rezende Mauro
Mariana Facchini Granato
Grupo de Trabalho de Desenvolvimento e Aprendizagem Sociedade de Pediatria de São Paulo

Foto: halfpoint | depositphotos.com