Plásticos: uma nova pandemia?

Plásticos: uma nova pandemia?

As práticas atuais de produção, uso e descarte de plásticos causam grandes danos à saúde humana e ao meio ambiente global e não são sustentáveis. Esses danos surgem em todas as fases do ciclo de vida do plástico.

Incluem impactos na saúde humana, como toxicidade neurológica, no desenvolvimento, desregulação endócrina e carcinogênese (processo em que as células neoplásicas proliferam e dão origem a um tumor). No oceano, os estragos dos plásticos vão muito além daqueles que são visíveis e bem reconhecidos do lixo das praias, destacando-se giros oceânicos (correntes marinhas rotativas, particularmente as que estão relacionadas com os grandes movimentos do vento) contaminados e danos físicos às espécies marinhas, que incluem deteriorações extensas aos ecossistemas marinhos.

Desde a década de 1970, a taxa de produção de plástico cresceu mais rapidamente do que a de qualquer outro material. Mais de 400 milhões de toneladas de plástico são produzidas a cada ano em todo o mundo e metade desse plástico é projetada para ser usada apenas uma vez. Da produção total, menos de 10% é reciclado.

Estima-se que 19 a 23 milhões de toneladas acabem anualmente em lagos, rios e mares. Se as tendências históricas de crescimento continuarem, a produção global de plástico primário deverá atingir 1.100 milhões de toneladas até 2050. Estima-se que o processo de degradação do plástico pode levar até 450 anos. Neste tempo, ele espalha-se pelo meio ambiente, podendo ser inalado ou ingerido pelos seres humanos. As consequências disto para a saúde humana ainda não foram totalmente esclarecidas.

A maioria dos itens de plástico nunca desaparece totalmente, apenas se quebra em pedaços cada vez menores. Os microplásticos – pequenas partículas de plástico de até 5 mm de diâmetro – podem ser encontrados em alimentos, água e ar e agora são onipresentes em nosso ambiente natural. Eles estão se tornando parte do registro fóssil da Terra e um marcador do Antropoceno, nossa atual era geológica. Por este motivo, até deram seu nome a um novo habitat microbiano marinho, chamado “plastisfera”.

Estima-se que em 2015 os custos relacionados à saúde da produção de plástico ultrapassaram US$ 250 bilhões globalmente e que, somente nos EUA, os custos de saúde de doenças, incapacidades e mortes prematuras, causadas apenas por três produtos químicos plásticos – PBDE (éteres difenílicos polibromados), BPA (bisfenol A) e DEHP [di (2etilhexil) ftalato], ultrapassaram US$ 920 bilhões.

O custo das emissões de gases de efeito estufa (GEE) do plástico causa danos econômicos avaliados em US$ 341 bilhões anualmente.

A Assembleia Ambiental das Nações Unidas do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) adotou uma resolução histórica em março de 2022, sobre a poluição plástica e o ciclo de vida dos plásticos.

Alguns itens merecem destaque:

–  produtos químicos são parte integrante dos plásticos. Até agora, há mais de 13.000 substâncias, como certos monômeros, por exemplo: ftalatos e bisfenóis;

–  produtos químicos preocupantes podem ser liberados do plástico ao longo de todo o seu ciclo de vida, durante a extração de matérias-primas, produção de polímeros e fabricação de produtos plásticos, mas também na reciclagem de plásticos e circularidade de materiais (por exemplo, através da  contaminação de novos produtos feitos de plásticos reciclados);

– produtos químicos preocupantes foram encontrados em plásticos de vários produtos, como brinquedos e outros produtos infantis, embalagens, equipamentos elétricos e eletrônicos, veículos, têxteis sintéticos, móveis, materiais de construção, dispositivos médicos, de cuidados pessoais, produtos domésticos, agricultura, aquicultura e pesca;

Ampla pesquisa científica com dados sobre os potenciais impactos adversos de cerca de 7.000 substâncias mostrou que mais de 3.200 delas têm produtos químicos que são persistentes e móveis no ambiente, acumulam-se no corpo, podem imitar, bloquear ou alterar as ações dos hormônios, reduzir a fertilidade, danificar o sistema nervoso e câncer.

Mulheres e crianças são particularmente suscetíveis a esses produtos químicos tóxicos, sendo que a exposição pode afetar próximas gerações. Exposições durante o desenvolvimento fetal e em crianças podem causar transtornos relacionados ao neurodesenvolvimento/neurocomportamentais, prematuridade, doenças pulmonares e até câncer. Nos homens, pode ocorrer queda da fertilidade.

 

As principais medidas para prevenir a exposição aos plásticos são:

– Evitar o uso de produtos químicos preocupantes em plásticos;

– Ter acesso à informação e aumentar a conscientização sobre produtos químicos em plásticos ao longo da cadeia de produção;

– Aumentar a disponibilidade e acessibilidade de alternativas mais seguras e sustentáveis.

A poluição plástica e seus impactos prejudiciais à saúde, economia e meio ambiente não podem ser ignorados. Chamar atenção em relação à exposição das crianças diante desta “nova pandemia” exige uma ação global e urgente para lidar contra a poluição plástica, proteger a saúde humana, o meio ambiente e promover a transição para uma economia circular, livre de tóxicos e sustentável.

 

Saiba mais:

– UNEA Resolution 5/14 entitled “End plastic pollution: Towards an international legally binding instrument”. Chemicals in Plastics – A Technical Report.

Disponível em: https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/39812/OEWG_PP_1_INF_1_UNEA%20resolution.pdf

– UN environment programme. Our planet is choking on plastic. Disponível em: https://www.unep.org/interactives/beat-plastic-pollution/?lang=EN

– Kortenkamp et al. Combined exposures to bisphenols, polychlorinated dioxins, paracetamol, and phthalates as drivers of deteriorating semen quality. Environment International, 2022;165:107322. Disponível em:

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35691715/

– Christopher, J. Plastic pollution and potential solutions. 2018;101:207-260. Science Progress. London Vol. 101, Ed. 3, DOI:10.3184/003685018X15294876706211

 

Relatora:
Kristine Fahl Cahali
Mentora do Programa de Embaixadores Saúde Planetária – PESP
Departamento Científico de Alergia e Imunologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo