Uma das grandes preocupações de pais de crianças com diabetes tipo 1 (DM1) é buscar um equilíbrio dos níveis de glicose diariamente e a longo prazo, com o objetivo de evitar as complicações agudas e crônicas da doença. Ao mesmo tempo, há o sentimento de reduzir o sofrimento dos filhos por conta das famosas “picadas” – seja para monitorizar os níveis de glicose, seja para a aplicação da insulina. A dieta desempenha papel importante no tratamento do DM1; abordaremos, neste espaço, alguns aspectos relativos à utilização dos carboidratos.
O carboidrato é um macronutriente que compõe a nossa pirâmide alimentar, sendo a base dela – ou seja, a maioria da nossa caloria consumida por dia é por conta dos carboidratos (pelo menos 50% a 55% das calorias diárias). Ao mesmo tempo, o carboidrato é a principal fonte que aumenta de forma imediata os níveis de glicose após seu consumo nos pacientes DM1. Por conta deste impacto, pelo receio de aumentos exorbitantes das glicemias após as refeições e, ao mesmo tempo, tentando buscar uma forma para aplicação de uma menor quantidade de insulinas bolus, algumas famílias buscam utilizar uma dieta com uma menor quantidade de carboidratos para as crianças DM1 – as famosas dietas low-carb (LC), very low-carb (VLC) e dieta cetogênica (DC).
Pensando-se na proposta e resultado dela, realmente pode haver um impacto positivo, tanto na redução dos níveis de glicose com estas dietas. No entanto, qual a segurança na realização delas em crianças DM1?
Pois atenção: toda criança, independentemente se apresenta doenças ou não, necessita de forma obrigatória dos carboidratos. Devemos lembrar que eles são a fonte imediata de energia para nossas células do corpo, e a redução drástica do seu consumo pode afetar o desenvolvimento e o rendimento da criança, podendo causar, por exemplo, apatia, sonolência, queda do rendimento escolar, entre outros comportamentos. Ao mesmo tempo, o carboidrato tem efeito direto na proliferação celular e, por isso, gera uma consequência direta no crescimento do indivíduo. Ou seja, uma redução além do normal no consumo de carboidratos em crianças pode afetar o crescimento e desenvolvimento delas a curto e longo prazo.
Outra questão que deve ser considerada: pelo fato de o carboidrato ser uma fonte imediata de energia, a redução do consumo nem sempre é tolerada na população pediátrica, gerando sintomas como fraqueza, tonturas, vômitos, entre outros.
Mais um aspecto a ser discutido: com a redução do consumo de carboidratos, a tendência é que a dieta seja reforçada por um maior nível de proteínas e gorduras. Estes, apesar de em menor proporção, possuem conversão e podem impactar também em aumento dos níveis de glicose após horas do seu consumo; além disso, o consumo aumentado de proteínas e gorduras pode gerar impactos nos níveis de colesterol, aumentar risco de obesidade, gerar impactos na saúde hepática e renal, etc.
As dietas VLC e DC, pela redução considerável do consumo de carboidratos, podem gerar um aumento da quebra do tecido adiposo corporal para fornecimento de glicose para fornecimento de energia – entretanto, este mecanismo pode causar a redução do pH sanguíneo (acidose) e aumentar a formação de corpos cetônicos – e a junção destes dois mecanismos pode levar a uma cetoacidose diabética mesmo com níveis normais de glicose, chamada cetoacidose diabética euglicêmica, que é uma emergência médica e deve ser tratada imediatamente.
Em resumo: crianças com DM1 devem ter uma dieta individualizada, com aporte calórico adequado e consumo correto de carboidratos, proteínas e gorduras. A redução do consumo de carboidratos na dieta não possui, a princípio, estudos que demonstrem segurança para o seu uso de forma indiscriminada. A alimentação do paciente DM1 deve ser acompanhada de forma rigorosa por um nutricionista, de tal forma que haja ajustes adequados para otimizar o crescimento, desenvolvimento e níveis adequados de glicose nas crianças DM1.
Relator:
Thiago Santos Hirose
Endocrinologista Pediátrico
Membro do Departamento Científico de Endocrinologia da SPSP
Diretor da Regional de Ribeirão Preto da SPSP


