INTRODUÇÃO Doenças mitocondriais são distúrbios causados por mutações no DNA mitocondrial ou em genes que codificam componentes mitocondriais. As manifestações clínicas são heterogêneas, afetando principalmente órgãos de grande demanda metabólica, como cérebro e músculo esquelético. Ainda não há fortes evidências na literatura que corroboram o uso de terapia farmacológica no tratamento dessas enfermidades.
DESCRIÇÃO Masculino, 3 anos, filho de união não consanguínea, encaminhado ao serviço devido a déficit pondero-estatural, hipotonia muscular global, desenvolvimento neuropsicomotor prejudicado e hepatomegalia. Negava convulsões prévias. Laboratorialmente apresentava hipoglicemia, hiperlactatemia, aumento de transaminases e acidose metabólica. Dieta específica para glicogenose tipo III foi introduzida. Durante 12 anos, paciente manteve hipoglicemias leves assintomáticas intercaladas por glicemias normais e hiperlactatemia, porém com normalização das dimensões hepáticas, das transaminases e da acidose metabólica. Sintomas neurológicos e musculares ainda eram marcantes, motivando investigação de doença mitocondrial. Sem alterações na ressonância magnética craniana e nos exames de ácidos orgânicos na urina, optou-se pela realização de biópsia muscular. Demonstrado proliferação mitocondrial sarcolemal e instituído tratamento com coenzima Q10. Após notável melhora nos sintomas musculares aumentou-se a dose da coenzima Q10 e associou-se L-carnitina. Atualmente paciente refere melhor desempenho escolar e redução nos episódios de dor muscular.
DISCUSSÃO Doenças mitocondriais e glicogenoses cursam com características semelhantes, pois ambas envolvem defeitos na produção energética. Nas glicogenoses a terapêutica inclui dieta específica enquanto que na doença mitocondrial são utilizados cofatores envolvidos no metabolismo mitocondrial. Apesar da carência de robustas evidências quanto à efetividade da utilização desses cofatores, no caso relatado, o uso de coenzima Q10 associado à L-carnitina demonstrou melhora nos sintomas musculares e neurológicos.
CONCLUSÃO Apesar de ser o principal biomarcador das doenças mitocondriais, a hiperlactatemia apresenta baixa especificidade. Prejuízo neurológico significativo e miopatia são achados que corroboram o diagnóstico. O uso de cofatores mitocondriais, em casos selecionados, está associado à melhora do quadro.