Relator:
Dr. José Lauro Araújo Ramos
Mestre e Doutor em Medicina pela FMUSP, Especialização em Prematuros pela Cooperation Technique Internationale e membro do Depto. Científico de Bioética da SPSP.
O que o novo Código de Ética Médica (CEM) contém, sobre situações de morte prevista ou iminente, está no Cap. I, alínea XXII: “Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados”. Entretanto, no Cap. V, Art. 41, lê-se que é vedado “abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal”.
O Cap. V do CEM destaca a autonomia do paciente ou seus representantes nas escolhas entre reconhecer que a doença é incurável (Art. 36, § 2 e Art. 41, § único) ou tratar com todos os meios (Art. 32), podendo levar a tratamentos fúteis, inúteis e dolorosos.
Em 28/11/2006, foi publicada no Diário Oficial da União a Resolução CFM 1805/2006 que estabelece que “é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal”. Porém, só em 01/12/2010, a Justiça Federal considerou improcedente o pedido do Ministério Público Federal de nulidade dessa Resolução.
“Morte com dignidade” é, portanto, tema constante e atual não só na Bioética, como na Justiça. Na Pediatria, entretanto, seu conceito é vago e ambíguo. Sendo a opção da criança por uma conduta exercida pelos pais, teria sentido um limite de idade para validar a autonomia do menor de idade?
A morte da criança nunca é vista com a serenidade da do adulto.
Talvez “morte digna” no jovem não requeira a mesma aceitação pela sociedade, família e paciente. Poder-se-ia pensar que estes sejam mais atraídos pela conduta de “fazer tudo” até o fim. Essa conduta, apoiada ou não pela família, com alívio da dor, deixa de ser “morte digna”? (vale lembrar as dificuldades no diagnóstico da dor na criança).
O que caracteriza uma “morte com dignidade”? Na literatura encontram-se como atributos dessa condição: qualidade de vida, não internação para prolongar a vida, ausência de dor e desconforto, morrer sem sofrer, estar com Deus e com a família, cuidados paliativos, decisão compartilhada, comunicação clara, relacionamento de ajuda e ambiente acolhedor. Apoio espiritual e religioso é sempre acolhido. Há, aparentemente, atributos da alçada dos cuidadores, da família e das instituições.
Muitas decisões sobre condutas no fim da vida no jovem são tomadas sob limitada autonomia do paciente. Assim, quando a morte da criança pode ser “não digna”? Se sofrer condições de “distanásia”?
Entretanto, um tratamento pode, às vezes, não ter sua futilidade reconhecida a tempo. Para o paciente considerado incurável, a passagem para cuidados paliativos não pode ser entendida como “fim do cuidado”. Com base nos atributos citados, é possível obter condições que deem ao cuidador o sentimento de que está havendo “morte digna” – parte do seu dever. Esse conceito, para a família, inclui uma série de atributos além do cuidado médico. Esse cenário apoia-se na convicção de que essa “dignidade” resulte no bem do paciente.
Texto original publicado no Boletim “Pediatra Informe-se” Ano XXVII • Número 155 • Janeiro/Fevereiro de 2011